Paulo Rosa
Vacinas: trabalhão de quase 300 anos
Por Paulo Rosa
Médico do SUS, Sociedade Científica Sigmund Freud Pelotas, TAO, Therapy & Art Organization, Houston - Pelotas
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O inglês Edward Jenner, 1749-1823, depois de laboriosa observação, muitos ensaios e perspicazes pesquisas, feitas inclusive no próprio filho, criou a noção de vacina, em 1796. Estudando em pormenor a varíola das vacas, observou que, surpreendentemente, as mulheres que ordenhavam, em contato direto com a doença animal, se tornavam pouco, ou nada, suscetíveis à varíola humana. Naquele então, a varíola - espécie de Covid piorada da época - atingia quase metade da população e alcançava cerca de 20% de mortalidade. Um escândalo. Morria gente a granel.
O pioneirismo de Jenner foi, pouco a pouco, sendo reconhecido. Passou a ser replicado em outros países, até que, depois de alcançar vacinação em massa - o intrépido Napoleão vacinou suas tropas militares - com algumas melhorias sanitárias, pasme-se: a varíola, em 1979, foi considerada erradicada do planeta, pela Organização Mundial da Saúde. Hoje os amigos não mais precisam vacinar-se contra esse vírus. Não há mais a doença entre humanos, façanha alcançada à força de muita vacina, muito trabalho. Talento humano memorável. Jenner é homenageado mundo afora, com seu nome em hospitais, bibliotecas e setores universitários. Todas as peripécias de descoberta até a consagração internacional das vacinas é, modernamente, o que se considera uma evidência. Esta vacina inaugural de Jenner, em pleno século 18, mudou o curso da história, coincidindo este achado médico com uma revolução na concepção do adoecimento humano, até ali concebido religiosamente, como uma expressão da ira dos deuses ou uma forma de punição pelos pecados executados pelas gentes.
Nesse então observou-se, entre os povos indianos e chineses, primeiramente, que casos leves de algumas doenças funcionavam como preventivos para novas formas desse adoecer. Com o correr dos dias esta noção ganhou força e serviu de base para a consagração do atual uso de vacinas, onde o vacinado, ao receber uma dose mínima do agente infeccioso, ele passa a ativar seu sistema imunológico que virá protege-lo de adquirir a doença ou, pelo menos, as formas graves dela. É o que se viu nesta última pandemia de Covid-19.
No século 18, a partir de Jenner, surgiram muitas controvérsias sobre o uso das vacinas e já ali se faziam presentes os ‘anticontagionistas’, aqueles que negavam que algumas doenças passavam de pessoa a pessoa, preferindo manter sua falta de reflexão a encarar fatos cientificamente observáveis. Dados pormenorizados sobre estes posicionamentos anticientíficos podem ser apreciados na obra monumental de História da Medicina, de Lyons & Petrucelli, Medicine, An Illustrated History, Abradale Press, 1987, 615 páginas.
Não é de hoje o que se viu de negacionismo da ciência na última pandemia planetária. Sempre haverá, desgraçadamente, estas humanas desumanidades. Isso creio.
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